«Magistrado queria vender por 450 euros um bilhete de 60 para o concerto de Madonna. Supremo confirmou pena.
Foi no dia 3 de Setembro que F. C., procurador adjunto do Ministério Público, se encontrou com um homem no centro comercial Almada Fórum para lhe vender um bilhete para o concerto de Madonna, que se realizou em 2008 no Parque da Bela Vista, em Lisboa. Até aqui tudo bem: F. C. tinha colocado um anúncio na Internet, propondo a venda por 450 euros (os bilhetes custavam 60 euros). O indivíduo respondeu e marcou-se o encontro. O bilhete n.º 45558 passou para as mãos do homem que entregou ao procurador adjunto 450 euros em notas de 20. Transacção concluída. Apenas um senão: o comprador era um inspector da ASAE.
O procurador adjunto em causa foi alvo de um processo disciplinar. O instrutor propôs como pena a demissão da magistratura do Ministério Público, mas o Conselho Superior ficou-se pela suspensão durante um ano. F. C. recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo (STA) que, a 7 de Setembro, confirmou a pena.
No recurso apresentado, o procurador invocou uma série de disposições legais para invocar a nulidade da decisão. Um deles foi a inconstitucionalidade da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE). Isto é, a Autoridade foi criada por decreto do Governo, que a equiparou a órgão de polícia criminal. Ora, a criação de uma polícia só pode resultar de uma decisão da Assembleia da República. Isto mesmo foi decidido em dois acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa. Porém, em Março de 2010, o Tribunal Constitucional afastou qualquer suspeita de inconstitucionalidade sobre a ASAE.
O procurador alegou ainda que o inspector da ASAE que o abordou funcionou, não como "agente encoberto", mas sim como "agente provocador". Ora, os conselheiros do STA também não lhe deram razão: "Provocador é o agente que desencadeia efectivamente o crime, não se limitando a revelar ou trazer à luz uma já subsistente propensão para o seu cometimento", refere o acórdão.
Concretizando: "A iniciativa partiu do arguido que teve conhecimento da colocação do anúncio; concordou com essa colocação e, posteriormente, respondeu à ASAE. Não foi a ASAE que provocou o arguido e gerou nele a intenção de vender o bilhete", acrescentam os juízes-conselheiros Américo Esteves (relator), António Madureira e António Políbio Henriques.
De acordo com os factos dados como provados, foi o procurador adjunto quem colocou no site lisboacity.olx.pt um anúncio, dando conta da intenção de vender por 450 euros o bilhete para o concerto. Um inspector da ASAE, através do e-mail ioo.repolho@gmail.com, respondeu ao anúncio: "Ainda tem o bilhete disponível? Estou comprador." E foi assim que F. C. iniciou o contacto com o inspector encoberto: "Sim, ainda o tenho disponível. Se estiver verdadeiramente interessado contacte para o n.° de telem. 96... para a marcação do encontro. Cumprimentos."
Durante o processo disciplinar, o procurador ainda alegou que os inspectores da ASAE erraram na identificação do casaco que vestia no dia da transacção. Mas foi contrariado pelos depoimentos dos homens da ASAE.»
in DN online, 03-10-2010
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