«Jorge Jesus, que esta quarta-feira foi ouvido como arguido no Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), por suspeita de fraude fiscal qualificada – tinha dois contratos com o Vitória de Setúbal, quando treinou o clube, entre 2000 e 2002.
Além do contrato ‘oficial’, o treinador aceitou assinar um outro, em que constava o suplemento de ordenado que recebia todos os meses mas não era declarado às Finanças. Este contrato paralelo apenas seria usado no caso de o Vitória querer prescindir dos seus serviços, prevendo-se que a indemnização a pagar teria por base o valor que efectivamente recebia (ou seja, a soma dos dois contratos).
Segundo o SOL apurou, também Luís Campos e Carlos Azenha, a equipa técnica de Jesus à época, tinham contratos iguais. Este último, aliás, foi já constituído arguido no mesmo processo, na semana passada, pelo DCIAP.
Para apagar vestígios, o V. Setúbal recorria à Planfin, uma empresa do grupo BPN que constituía offshores e oficialmente fazia «planeamento fiscal agressivo». A relação do clube com o grupo então dirigido por Oliveira Costa – que o levaria, aliás, ao estado de falência em que actualmente se encontra – remonta à venda dos terrenos em redor do seu estádio ao BPN e a parceiros da construção civil de Setúbal, que ali pretendiam construir um centro comercial e um complexo habitacional, projectos que se goraram. Essa venda foi feita através de sociedades criadas pela Planfin. Em troca, o BPN daria ao Vitória um terreno para a construção de um novo estádio, no Vale da Rosa, o que até hoje também não aconteceu, estando o caso também sob investigação do DCIAP.
Apanhado no Furacão
A fraude que envolve o actual treinador do Benfica foi detectada pela investigação da Operação Furacão, na sequência de buscas efectuadas em 2005 a vários bancos, entre os quais o BPN. Os investigadores do DCIAP, liderados pelo procurador Rosário Teixeira, e elementos da Inspecção Tributária apreenderam vária documentação: entre esta, descobriram uma offshore, feita pela Planfin, em nome do Vitória. Há um ano, foram feitas buscas ao próprio clube, tendo-se confirmado a suspeita de que era grande a diferença entre o que o Vitória pagava a Jesus e aos seus adjuntos e o que estes declaravam ao Fisco.
Para decifrar o esquema, os investigadores contaram com a ajuda de arguidos e testemunhas – nomeadamente de Jorge Goes, o presidente do Vitória à época, constituído arguido há um ano.
O dinheiro começava por sair do clube, por cheque, para a Planfin. Esta, através de facturas fictícias passadas por ‘sociedades-fantasma’ (e que supostamente prestariam serviços de assessoria ao clube), fazia com que a quantia regressasse ao Vitória, na forma de dinheiro vivo. Assim era compensada a quantia suplementar paga ao treinador, sendo que estas saídas e entradas de dinheiro, segundo Goes, ficavam registadas no clube. Por isso, o V. Setúbal será também constituído arguido, por fraude fiscal agravada e ainda por branqueamento de capitais.
Pagamento suspende processo
Esta terça-feira, um dia antes de ir prestar declarações no DCIAP, o actual treinador encarnado optou por pagar 119 mil euros, relativos ao imposto em falta, pelos vencimentos não declarados nos dois anos que esteve no Vitória. Isto para evitar uma acusação do Ministério Público e a ida a julgamento, em que incorreria numa pena que pode ir até seis anos de prisão.
Jorge Jesus faz agora parte da longa lista dos quase 300 arguidos da Operação Furacão que beneficiam, por terem acertado contas com as Finanças, da suspensão provisória do processo. Em troca, não poderá cometer nenhum crime fiscal nos próximos dois anos – caso contrário, será levado a tribunal.
Também Jorge Goes irá beneficiar deste estatuto, não tendo, porém, de pagar qualquer quantia, uma vez que se considera que foi o treinador e os seus adjuntos quem lucrou com a fuga aos impostos.
Segundo o SOL apurou, até agora todos os arguidos que prestaram declarações no DCIAP têm admitido os ilícitos fiscais que cometeram – acrescentando, no entanto, que foi a sua primeira vez.»
in SOL online, 03-7-2011
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