Carlos Cruz ‘limpou’ a grande parte das contas analisadas pelos peritos do Núcleo de Assessoria Técnica (NAT) da Procuradoria-Geral da República nas semanas seguintes à sua detenção, no início do mês de Fevereiro de 2003.
No documento da perícia financeira, a que o CM teve acesso, pode verificar-se que a grande parte das contas bancárias de Cruz e das suas empresas ficou praticamente sem dinheiro no mês de Fevereiro desse ano. Um desses exemplos é da Marajó, a empresa criada por Cruz e pela sua ex-mulher Marluce.
A 7 de Fevereiro de 2003, já depois de Cruz ter sido detido por suspeitas de pedofilia no caso Casa Pia, deu entrada na conta da Marajó um cheque de 267 750 euros, um pagamento da SIC, empresa onde o apresentador trabalhava na altura. "Entretanto, a 11 de Fevereiro de 2003, a conta apresenta um saldo negativo de 2371,10 euros, uma vez que a conta foi ‘limpa’ através da emissão de quatro cheques, com datas de 10 e 11 de Fevereiro", pode ler-se no documento a que o CM teve acesso.
Mas esta não foi a única conta que ficou a ‘zeros’ por esta altura. O mesmo sucede com a conta conjunta que Cruz tinha com a sua filha Marta e que apresentava à mesma época um saldo de 42 euros. No caso de uma conta da CCA, que durante o ano de 2002 recebeu depósitos de 757 mil euros, acontece o mesmo fenómeno. "O saldo do último extracto existente de 17/02/03 apresenta um valor de apenas 1181 euros." O documento refere ainda que a partir do ano 2000 a CCA parece que deixou de ter actividade própria, "uma vez que os depósitos da conta bancária analisada não evidenciam pagamentos de clientes, mas sobretudo transferências provenientes de outras contas de Carlos Cruz, designadamente das tituladas pela empresa Marajó e Ficvídeo [ambas de Carlos Cruz], indiciando uma situação de ‘engenharia financeira’".
O documento prossegue com a análise a outras contas das empresas de Cruz e em todas acontece o mesmo: diversas transferências entre as várias empresas e as contas praticamente vazias em Fevereiro de 2003. Na Ficvídeo, em 2003 "salienta-se apenas o desconto de cheques, pelo que o último extracto analisado (21/02/03) revela um valor insignificante de 181,22 euros". No caso da CC2 Informática, em Fevereiro de 2003 o saldo é de 7,20 euros. "Salienta-se que, à medida que os depósitos de valores são registados na conta, vão sendo emitidas ordens de pagamento para o estrangeiro, não sendo possível explicar este procedimento". Outra conta, da CCA Design, apresentava em 3 de Março de 2003 saldo negativo de 281 euros.
MÃE DE RAQUEL LEVANTA CHEQUE
A ‘limpeza’ das contas da Marajó, como foi classificada pela investigação, foi feita após a detenção do apresentador de televisão através da emissão de quatro cheques a 10 e 11 de Fevereiro de 2003. O de maior relevo tinha a importância de 233 mil euros e foi levantado ao balcão pelo portador "Juvenália Maria Rocheta", a mãe da actual mulher de Carlos Cruz. Além disso, foram emitidos mais três cheques, um no valor de dez mil euros para a CCA, um de 16 366 euros em nome de Arnaldo Vieira Reis e um de cinco mil euros que a investigação não conseguiu identificar o destino. Após estes levantamentos ‘desapareceram’ os 267 750 euros que a SIC tinha pago dias antes a Carlos Cruz.
EMPRESAS SEM PAGAMENTO DE SALÁRIOS
A análise feita às contas das várias empresas de Carlos Cruz levantou suspeitas à investigação, isto porque não foram detectadas as normais transferências de salários ou pagamentos de contas. Sobre a Marajó pode ler-se: "Não se evidenciam pagamentos das despesas habitualmente existentes em empresas, nem tão pouco de pessoal ou de entregas à Segurança Social." De referir ainda que na Ficvídeo, outra das empresas de Carlos Cruz, Isabel Rocha tinha responsabilidade conjunta para movimentar as contas. Isabel Rocha foi quem comprou a participação de Cruz na Marajó dias antes da leitura da sentença da Casa Pia.
MARTA TINHA CONTA COM O PAI
Foi numa conta do antigo apresentador e da sua filha Marta que foi paga a participação de Carlos Cruz na campanha pelo Euro’2004, cerca de 100 mil euros (20 mil contos). Estão registados vários créditos resultantes da venda de acções e de transferências da empresa Marajó. É desta conta também que os investigadores verificaram "transferências permanentes para a conta de Marluce Silva", a ex-mulher de Carlos Cruz, e para Raquel Rocheta, a actual esposa. Desta conta foi passado um cheque de 10 mil contos à ordem de "Augustus", segundo a investigação. Em Fevereiro de 2003, a conta conjunta evidencia um saldo de apenas 42 euros.
MOTA FEZ DEPÓSITOS DE LARGAS QUANTIAS
Carlos Mota, antigo secretário pessoal de Carlos Cruz – actualmente procurado internacionalmente pela Justiça portuguesa – movimentou grandes somas de dinheiro de e para as contas pessoais e das empresas do antigo apresentador.
Segundo documentos da investigação feita às contas tituladas por Carlos Cruz a que o CM teve acesso, Carlos Mota, entre 2000 e 2002, fazia depósitos em numerário nas contas de Cruz. Por exemplo, em 2002, no dia 15 de Novembro, Mota depositou em dinheiro 40 mil euros e, a 12 de Dezembro, mais 20 mil euros. Oito dias mais tarde, ainda em Dezembro de 2002, o então secretário depositou mais de 60 mil euros em numerário no balcão do BCP de Campo de Ourique. Foi também em finais de 2002 que Carlos Mota desconta das contas da empresa Marajó quatro cheques que totalizaram mais de 49 mil euros.
Mota fugiu há sete anos, depois de uma visita a Cruz, na cadeia. Na ocasião, entrevistado pelas televisões, declarou: "Se ele é pedófilo, eu também sou." Dias depois era divulgado pela SIC um caso de suspeitas de abuso sexual de menores ocorrido em Odemira e envolvendo Carlos Mota. As últimas informações apontam para a sua permanência no Brasil.»
in CM online, 18-9-2010
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