sábado, 4 de setembro de 2010

"A justiça que sai da Casa Pia" por João Marcelino, director do Diário de Notícias

- João Marcelino -


«Independentemente dos erros cometidos ao longo de todo o processo, e dos excessos que se verificaram, lida a sentença do julgamento da Casa Pia fica a ideia de que, apesar da esperada indignação manifestada pelos arguidos condenados e seus advogados, a justiça terá funcionado e terá cumprido - mais ou menos lentamente -, como se lhe exige, o seu papel.

Importa agora fazer algumas reflexões. A primeira das quais resulta da percepção factual de que a justiça é demasiado lenta. De facto, o processo Casa Pia arrastou-se durante oito longos anos. Foi objecto de inúmeros incidentes processuais. Exige-se, pois, a revisão dos códigos processuais de forma a tornar mais célere a aplicação da justiça. À investigação criminal têm de ser impostos prazos rigorosos de modo a impedir o arrastamento ad eternum dos processos judiciais. Às defesas dos arguidos, sem prejuízo do respeito por todas as garantias constitucionais, há que impor rigor na utilização de requerimentos que, muitas vezes, não passam de manobras dilatórias que visam unicamente desestabilizar os processos.

Por outro lado, tal como noutros casos que gozam de um mediatismo extremo, houve naturalmente momentos de grande efervescência. A defesa dos arguidos - sobretudo os mais mediáticos - tentou, durante todo o processo, desacreditar os argumentos da acusação. As armas até podem ser legítimas, mas que diabo? Um processo que passou já pelo escrutínio de três juízes - Rui Teixeira na fase de inquérito, Ana Teixeira e Silva na fase de instrução e Ana Peres na fase de julgamento -, isto para já não falar dos desembargadores do Tribunal da Relação de Lisboa que validaram os indícios, tem de ter crédito.

E, tendo aliás em conta o impacto social de alguns dos arguidos, o Ministério Público tentou assegurar o respaldo da opinião pública garantindo que o julgamento popular se concluísse antes de tomada a decisão do tribunal. É evidente que esta prática não é aceitável num Estado de direito. Mas não tenhamos ilusões: será sempre assim de cada vez que estiverem em causa processos tão apaixonantes como este.»
in DN online, 04-9-2010

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