sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Rostos do processo Casa Pia: o que mudou na vida deles




Carlos Cruz
Apresentador e arguido
“De rico e poderoso passei a pobre e poderoso.” É com ironia que o apresentador de televisão resume o abanão que o escândalo lhe deu. A filha mais nova nem falava quando foi preso e ensiná-la a lidar com as notícias foi um dos seus desafios. Outro foi reajustar as contas domésticas, porque os rendimentos ficaram limitados aos três mil euros de pensão. Vendeu duas casas e quadros para pagar as contas e diz ter a agradecer a ajuda de familiares e amigos. Afastado dos ecrãs, prepara um regresso. E na vida privada nem tudo foram espinhos: nestes anos foi avô e manteve total confiança da mulher e da família.


Manuel Abrantes
Antigo provedor e arguido
“Mudou de 80 para zero.” Manuel Abrantes confessou ao i que a sua vida profissional sofreu uma grande alteração. “Desde o momento em que foi expulso da instituição, em Janeiro de 2003, a minha carreira profissional extinguiu-se”. O arguido foi pai recentemente e hoje gere uma empresa de rent-a-car na zona de Lisboa. Questionado sobre projectos futuros, responde: “Não tirei uma licenciatura e um mestrado para ficar como gerente de uma empresa.” Manuel Abrantes garante que tem projectos e planos para o futuro, que pretende revelar caso consiga a “liberdade”.

Ferreira Diniz
Médico e arguido
“Estive em consultas o dia todo”, justifica João Ferreira Diniz por não ter respondido à chamada do i. “Os meus pacientes continuaram a vir às consultas, a trazer os filhos e os que traziam os filhos trazem agora os netos.” A nível profissional, Ferreira Diniz, lamenta apenas ter deixado de receber convites para os congressos de medicina. Está confiante quanto à absolvição e a continuar a sua vida normalmente: “A nível profissional nada se alterou.” O médico que conta ter sido “recusado por dois bancos e expulso do banco Santander” quer também regressar ao mundo académico.

Jorge Ritto
Ex-embaixador e arguido

A discrição manteve-se do início ao fim do julgamento. Pouco falou para clamar inocência, mas a estratégia de defesa obrigou-o a expor o diário íntimo, que _falou por ele. O objectivo: argumentar que não pratica sexo anal desde 1967, para afastar as acusações que lhe são feitas. Tinha 66 anos quando foi acusado e ainda mantinha a situação de disponibilidade perante o Ministério dos Negócios Estrangeiros (podendo ser destacado para missões excepcionais). Entretanto reformou-se e mantém uma vida reservada, com poucos contactos com os outros arguidos.


Hugo Marçal
Advogado e arguido
O advogado vive sob medicação e acompanhamento desde o início do processo. “A minha saúde mental degradou-se muito.” A nível patrimonial, o arguido assegura ter perdido fortunas e admite ter pedido dinheiro a familiares. “Vivi no limiar da miséria, tive de fazer refeições em casa de pessoas e nem tinha dinheiro para o combustível, para me deslocar ao tribunal.” No entanto, assegura que a pior fase – “o monstro” – já passou. Recorda de positivo as amizades com os outros arguidos e quer recuperar tudo o que perdeu a nível profissional.

Gertrudes Nunes
Arguida
O cuidado que tem a resguardar-se sempre que aparece em público, tentando esconder-se atrás de lenços, é escusado na cidade onde vive. Em Elvas toda a gente conhece a mulher acusada de alugar a casa para actos sexuais com menores. Nunca deu entrevistas. Em tribunal, assegurou estar inocente e afirmou ter sido pressionada pelo Ministério Público, na fase de inquérito, para dizer que alguma coisa se tinha passado. Quando o caso estalou, havia quem fosse de propósito ver a famosa casa de Elvas, situada numa zona periférica chamada cidade-jardim.


Pedro Namora e Adelino Granja
Antigos alunos

Pedro Namora e Adelino Granja são ex-alunos da instituição. Foram denunciantes do caso de abusos sexuais na Casa Pia. Os dois advogados tiveram percursos diferentes no processo. Pedro Namora afirma que deixou “de ter vida própria para desmascarar criminosos”. Vive com acompanhamento médico, suspendeu a advocacia durante quatro anos “para não ser acusado de protagonismo”. Espera recuperar o que ganhava antes. Granja assegura que a vida profissional foi abalada, mas “a fama” trouxe-lhe mais clientes. O ex-aluno espera que a decisão lhe permita ter uma nova vida.

João Guerra e Rosa Mota
Investigadores

Dos responsáveis pela equipa que investigou o caso de pedofilia, só o procurador João Guerra não mudou de serviço. Continua no Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa e já depois de terminado o inquérito, o Casa Pia continuou a persegui-lo. Em 2007, quando foi ouvido na comissão parlamentar de inquérito ao caso do Envelope 9, recusou a captação e divulgação de imagens. O inspector-chefe Dias André, da PJ, reformou-se, enquanto Rosa Mota transitou para a Unidade Nacional de Combate à Corrupção e está, actualmente, na Unidade de Combate ao Tráfico de Estupefacientes.

Rui Teixeira
Juiz

Foi por acaso, por ter autorizado uma busca quando um colega estava de férias, que ficou com a instrução do inquérito. Nos primeiros tempos foi herói, até que a polémica à volta da prisão de Paulo Pedroso se atravessou na carreira. Há um ano, o Conselho Superior da Magistratura decidiu congelar-lhe a nota até que ficasse esclarecido o pedido de indemnização do ex-deputado e a questão do eventual “erro grosseiro” do juiz. O recurso para o Supremo permitiu que lhe fosse de imediato reconhecida a avaliação de Muito Bom. Está colocado em Torres Vedras, com uma breve comissão de serviço em Timor pelo meio.


Paulo Pedroso
Vereador do PS

Quando um mandado de detenção entrou pelo parlamento, era considerado o delfim de Ferro Rodrigues. Meio ano depois, quando foi libertado, em São Bento a recepção foi efusiva, mas a sombra do processo ficou. Entre 2005 e 2007, esteve na Roménia a assessorar o governo na preparação da adesão à UE. No regresso, voltou ao lugar de deputado, mas nas últimas autárquicas virou-se para a Câmara de Almada. Perdeu, mas assumiu o lugar de vereador e mantém voz activa dentro e fora do PS. Está em preparação o recurso do acórdão que revogou a indemnização exigida ao Estado, por ter estado preso.
in "i" online, 03-9-2010

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