Foi o advogado de Rosalina Ribeiro no Brasil quem participou à polícia o seu desaparecimento, três dias depois do homicídio, e quem deu a notícia a Duarte Lima. Normano Ventura Marques começou como advogado de Lúcio Tomé Feteira mas, depois da morte do empresário, passou a representar os interesses de Rosalina. Em entrevista ao i, o advogado brasileiro garante que o facto de Duarte Lima "não estar disponível para responder às perguntas da polícia" tem sido um entrave à investigação e revela que a relação de Tomé Feteira com a filha, Olímpia Feteira de Menezes, era "a pior possível".
Tem-se falado muito de Rosalina Ribeiro. Que impressão tinha dela?
Era uma pessoa forte, muito centrada. E que só ficou destabilizada a seguir à morte de Tomé Feteira, por ter perdido um importante ponto de apoio.
Como era a relação dos dois?
De grande amor e respeito. Viviam como se fossem casados, daí ter pedido a união estável na justiça brasileira.
E a relação de Tomé Feteira com a filha Olímpia?
A pior possível, ao ponto de ele a chamar, num vídeo, de víbora.
A que vídeo se refere?
Ele vendeu um terreno a Sousa Cintra quando já tinha 98 anos, em 2000, por três milhões de reais (1,3 milhões de euros). A escritura foi filmada e ele, ao responder a uma pergunta sobre a filha, classificou-a de víbora.
Mas porque é que se davam mal?
Havia um ódio grande, da parte de Olímpia, por causa do outro filho, Lucito, que morreu em 1975 e a quem foram dadas todas as atenções por ser doente. Olímpia sentia-se rejeitada e sempre andaram às turras e em disputas de dinheiro, mesmo quando o senhor Feteira era vivo.
Rosalina foi conduzida para uma cilada?
A polícia está convencida disso desde o início, pelas características do homicídio. Houve um primeiro tiro no tórax e um segundo na testa. Isso mostra que quem a matou quis certificar-se de que não sobreviveria. Tanto ela como o senhor Feteira nunca saiam àquela hora porque tinham medo de ser sequestrados ou assaltados. É estranho ter ido a uma reunião duas cidades depois da dela às oito da noite.
Qual seria o papel de Duarte Lima?
Ele é um dos principais suspeitos da polícia brasileira, sobretudo pela atitude que tem demonstrado - não prestar depoimentos. Partindo do princípio que o que ele diz é verdade, Duarte Lima será apenas alguém que está no local errado à hora errada e que acaba por levar a D. Rosalina para uma cilada. O facto de ele ter invocado segredo profissional foi uma das dificuldades com que a polícia brasileira se deparou.
Para que seria esse encontro?
Ela queria vender uma parte do quinhão de uma fazenda a um industrial, que tinha feito um contrato de arrendamento por 20 anos para a extracção mineral de areias nessa propriedade. Esse industrial incompatibilizou-se com Olímpia e, para assegurar a sua actividade, propôs a Rosalina comprar-lhe uma parte. Fui contra o negócio porque em Portugal o testamento ainda estava em discussão e ela podia correr o risco de vender algo que ainda não era seu. Desde então nunca mais falámos.
Foi a última vez que a viu?
Sim, 15 dias antes de morrer. Duarte Lima também a aconselhou a não fazer o negócio, o que causa espécie à polícia: se não concordava porque a levou a Maricá? Não está esclarecido o propósito daquele encontro. Só se sabe que Duarte Lima a deixou à porta de uma pousada, onde foi recebida por uma mulher chamada Gisele.
Há pistas sobre quem será Gisele?
Não. Nunca foi localizada. A única pessoa que viu Gisele foi Duarte Lima - que não atende às solicitações da polícia para tentar reconhecê-la ou fazer um retrato-robô.
Ela tinha problemas de dinheiro?
Tinha as contas em Portugal bloqueadas pelos processos que estavam em tribunal.
Daí querer vender parte da herança?
Pelo que sei, esse seria única e exclusivamente o motivo.
Rosalina estava a travar algum processo na justiça brasileira?
Só o inventário e uma acção de prestação de contas que moveu contra Olímpia.
Por ter transferido dinheiro das contas de Lúcio Tomé Feteira?
Não posso afirmar isso, porque o processo ainda não foi concluído, mas que ela recebeu património brasileiro em Portugal e não o declarou no espólio português nem no brasileiro, isso é verdade.
Estamos a falar de que quantias?
No valor actual, seriam 10 milhões de euros.
Alertou a polícia para o desaparecimento da sua cliente?
Fui contactado no dia 9 de manhã por amigos que deram pela sua ausência. A lei brasileira só permite apresentar queixa 48 horas depois do desaparecimento. Houve uma confusão, porque ela saiu de casa no dia 7 à noite. O porteiro pensou tê-la visto no dia 8 à tarde e só fui à polícia no dia 10. Mais tarde, as imagens das câmaras de vigilância mostraram que ela não voltou depois de dia 7. Nesse mesmo dia 10 avisei Duarte Lima do desaparecimento.
Porque é que Duarte Lima não assinava as peças processuais?
Ele era o consultor de Rosalina, aconselhava-a. Como exercia um cargo público, indicou-lhe um colega em Portugal, com quem ela mantinha contacto frequente.
Mesmo assim, terá recebido transferências de dinheiro avultadas...
Só soube disso depois do funeral. Rosalina sempre negou que tivesse dinheiro na Suíça, que tenha assinado qualquer cheque ou transferência. Era essa a sustentação dela no processo. Dizia sempre: "Saquei alguma coisa? Transferi alguma coisa? Mostrem a minha assinatura, então!" Sobre cartas rogatórias ou sobre as acusações de Olímpia não sei nada. Só sabia, aliás, do património do senhor Feteira no Brasil.»
in jornal "i" online, 18-8-2010
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