O Brasil permanece atónito, incrédulo, com o caso do guarda-redes Bruno Fernandes, do Flamengo. É comum ver-se jogadores, quase todos de origem muito pobre, envolvidos com mulheres, bebidas - e até com uso de drogas, o que é mais raro. Porém, um caso grave de assassínio é praticamente inédito na alta-roda futebolística. Tanto assim que o clube de Bruno, o Flamengo, além de suspender o seu contrato - optou por não rescindi-lo totalmente, com receio de ter de pagar multas - decidiu que, a partir de agora, será incluída uma cláusula que obriga todo o jogador do clube a ter bom comportamento não só no plano desportivo mas também no plano social.
O Flamengo é o actual campeão brasileiro, mas a presidente do clube, Patrícia Amorim, chegou a admitir ter pago um preço demasiado alto para obter esse título. E por que motivo falou assim? Porque o guarda-redes esteve muito longe de ser o único jogador que causou dores de cabeça aos responsáveis do Flamengo com as constantes brigas que mantinha com as suas amantes, várias vezes documentadas na imprensa. Por outro lado, Adriano ("o imperador") e Vagner Love foram acusados de envolvimento com dirigentes do tráfico de drogas e ambos foram chamados a explicar, na polícia, as ligações perigosas que mantinham.
No Brasil, os jogadores pagam um preço elevado pela sua ascensão social. Não poucos deles - inclusive Robinho, figura indiscutível da selecção brasileira - tiveram parentes sequestrados. Não admira: são pessoas ricas com parentes pobres que residem em locais muito acessíveis.
No caso de Bruno, tratou-se de algo inédito. O jogador já mostrava um comportamento anti-social e certa agressividade, mas daí à acusação de cometer um crime bárbaro vai uma enorme diferença. Antes de vir a público o caso do homicídio da sua amante, Eliza Samúdio, ela mesma foi à polícia, acusando-o de violência. Em resposta, Bruno disse que todos os homens já discutiram ou até bateram pelo menos numa mulher, uma declaração que chocou a opinião pública.
Mas este era apenas o início de todo o caso.
Bruno Fernandes das Dores de Souza, mais conhecido apenas como Bruno, tem só 26 anos. Ganha um salário, do Flamengo e de patrocinadores, não inferior a cem mil euros por mês - os valores exactos não foram divulgados. Tinha boas possibilidades de ser vendido para o Milan, de Itália, e só não foi chamado à selecção brasileira para disputar o Campeonato do Mundo da África do Sul devido ao seu temperamento irritadiço; se fosse apenas pelo nível do seu futebol, certamente teria sido convocado para o Mundial. Ao ser acusado do bárbaro assassínio da ex-amante Eliza Zamudio, atirou o seu futuro promissor para o lixo.
Revelação no Atlético Mineiro, Bruno estreou-se em 2005, com sucesso, e ganhou ainda mais fama ao transferir-se para o Flamengo, que é o clube mais popular do Brasil, em 2006. Desde então, tornou-se titular indiscutível da equipa.
Além das suas boas actuações entre os postes, em lances normais de jogo, é também conhecido por ser especialista na defesa de grandes penalidades. Na final do campeonato do Rio de Janeiro, em 2007, foi responsável directo pelo sucesso da equipa, pois defendeu dois penaltis no jogo decisivo.
A história repetiu-se dois anos depois: Bruno foi o maior responsável pela conquista do tricampeonato regional pelo Flamengo, ao defender uma grande penalidade no período normal de jogo e duas outras, no termo do encontro, que ditaram o seu desfecho.
Bruno é bom também com os pés: já marcou quatro golos pelo Flamengo, sendo um de grande penalidade e três na cobrança de outras faltas. É o guarda-redes que mais golos marcou golos pelo histórico clube brasileiro.
É oriundo de uma família pobre, como tantos outros jogadores. A mãe enfrentou uma acusação de homicídio e o pai já foi preso por diversas vezes, acusado de furto e de violência. O irmão Rodrigo, de 20 anos, também já foi preso. Mas isto não explica - e muito menos justifica - o seu percurso da glória máxima à desonra total.
Ontem mesmo, o homem habituado a tantas vitórias conheceu uma nova derrota: a justiça brasileira negou-lhe o pedido de habeas corpus que o seu advogado havia solicitado. Bruno Fernandes vai continuar na prisão. E poderá lá ficar durante muitos anos. Os seus dias de apogeu nos estádios parecem ter ficado definitivamente para trás.»
Texto in DN online, 17-7-2010
Imagem in Google
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