A leitura da sentença do processo Casa Pia foi adiada pela segunda vez. A primeira registou-se a 9 de Julho, justificando-se o adiamento para ontem com a obrigatoriedade de se exercer o contraditório sobre o novo relatório social requerido para Carlos Silvino, "Bibi". A desculpa, ontem apresentada para adiar a diligência para 3 de Setembro, é a de que a presidente do colectivo de juízes, Ana Peres, necessita de tempo para redigir o acórdão.
O Conselho Superior da Magistratura (CSM) admite que foi apanhado de surpresa com este segundo adiamento, mas diz que "não há nenhum drama". Porém, os magistrados da Associação Sindical de Juízes Portugueses (ASJP) e da Associação Juízes pela Cidadania (AjC) concordam que se trata de mais um momento desprestigiante para a imagem da justiça portuguesa. Porém, o DN sabe que a maior dificuldade em dar a conhecer a sentença aos sete arguidos, há mais de cinco anos em julgamento, prende-se com a falta de entendimento entre os três magistrados do colectivo relativamente à valoração das provas.
Segundo fontes contactadas pelo DN, o mal-estar entre o colectivo é patente há mais de um ano, sobretudo depois das alegações finais iniciadas a 24 de Novembro de 2008 e terminadas em Maio de 2009. O desentendimento tem vindo a ser comentado pelos intervenientes processuais, ao ponto de, a certa altura, recordam as fontes do DN, o arguido Carlos Cruz ter desabafado: "Um juiz quer condenar-me e outro quer libertar-me." O magistrado mais inclinado para a libertação seria Ana Peres e o mais empenhado na condenação seria Lopes Barata.
Um magistrado judicial ouvido pelo DN garante que a sentença já estaria cá fora há pelo menos dois anos se tivesse havido um bom entendimento entre o colectivo. "Houve falta de liderança disciplinadora. Deixaram fazer tudo o que os advogados quiseram para evitar recursos incidentais. Não os evitaram, existem cerca de 300, e entorpeceram o processo", disse. De mais a mais, acrescentou, "com pessoas que estão em exclusivo naquele processo". "Os juízes não fazem mais nenhum processo. Só têm aquele. As sessões deveriam ter sido marcadas com outro ritmo. A justiça teria ficado mais prestigiada se a sentença tivesse sido emitida há dois anos", frisou.
Ricardo Sá Fernandes, advogado de Carlos Cruz, lamentou o adiamento, mas mostrou-se conformado. "Mais vale tarde e bem, do que mais cedo e mal", disse.
O advogado de Carlos Silvino reagiu de modo diferente. José Maria Martins considerou "totalmente incompreensível", e associou o "atraso intolerável de todo o processo" a "pressões do poder político".
Por seu lado, Miguel Matias, advogado das vítimas, considerou que mais este adiamento "prejudica todos os intervenientes do processo que já vai longo".
A defesa de um outro arguido estranhou que o adiamento tenha sido anunciado apenas ontem, ao final da manhã. "As razões invocadas já existem há muito tempo", disse, tendo sublinhado: "E quem marca para 5 de Agosto, em plenas férias, é porque supostamente seria para cumprir. Além de que, achávamos nós, a esta altura já não estaria em causa a redacção do acórdão mas sim a revisão e correcção de algumas coisas." Mais ainda: Depois do comunicado do CSM, "pensávamos que desta é que era!", frisou.
Para António Martins, presidente da ASJP, o adiamento é para lamentar, observando que cabe ao CSM avaliar o desempenho dos juízes e dos tribunais. Para Rui Rangel, da AjC, o tempo é de credibilização e de reforço da boa imagem da justiça, e este novo adiamento é mais um contributo para a descredibilização.»
in DN online, 29-7-2010
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