«"Parecia ter o perfil certo para lidar com menores", desabafa Fernanda Costa. A presidente do Conselho Executivo da escola EB 2/3 Júlio Brandão, em Famalicão, fala de Luís Paulo, o professor de 43 anos que ali dava aulas de apoio a alunos com dificuldades de aprendizagem. Há uma semana soube da detenção do docente pela Polícia Judiciária (PJ) por suspeitas de abuso sexual de um adolescente. Logo ele cuja "idoneidade, responsabilidade e grande profissionalismo", tinham levado o agrupamento escolar a indicá-lo - e o Ministério da Educação (ME) a aceitar a sugestão - para membro da comissão local de protecção de crianças e jovens (CPCJ).
Luís Paulo leccionava apenas 4 ou 5 horas semanais na escola do 1º ciclo. À CPCJ de Famalicão dedicava mais de 20, como membro da comissão restrita. Foi aí que conheceu o rapaz de 16 anos que o acusa agora de abuso sexual. Era um dos casos que o professor geria sozinho. A ele cabia dar "um projecto de vida" ao jovem em risco, sinalizado por ter sido vítima de abuso.
Na casa do docente em Famalicão, onde vivia sozinho, a PJ encontrou pornografia infantil no computador portátil - "são indícios fortíssimos, indicadores da prática do crime específico com este menor", garantiu ao Expresso fonte da investigação.
As provas materiais foram suficientes para o tribunal de Santo Tirso indiciar o professor pela prática de crime de abuso sexual de menor dependente e de posse de pornografia infantil. Deixou-o em liberdade, mas proibiu-o de contactar com crianças. "Para evitar alarme na comunidade educativa". A Direcção Regional de Educação do Norte (DREN) suspendeu também o docente.
Mas deverá ser um afastamento temporário. Actualmente nem uma condenação judicial garante a expulsão do ensino de um professor acusado de abuso de menores - a pena acessória de afastamento é facultativa e fica ao critério do juiz -, ou sequer impede o início da carreira lectiva. Diz o Ministério da Educação que "a constituição de um docente como arguido, bem como a pronúncia ou mesmo a condenação, não desencadeia automaticamente qualquer medida", ressalvando que no caso do abuso de menores é, em norma, instaurado processo disciplinar. Quanto ao acesso à profissão, "os candidatos à docência não carecem de apresentação de certidão de registo criminal".
De exemplo serve o caso do professor de música de Gondomar. Em 2005, o docente de 28 anos foi indiciado e mais tarde acusado de 20 crimes relacionados com abuso sexual de menores, com onze alunas entre os 13 e os 15 anos. A DREN suspendeu-o, mas a 'pena' caducou com o fim do contrato; o tribunal decretou o afastamento das vítimas, mas não de menores em geral. Por isso, enquanto aguardou pelo julgamento, o professor voltou a dar aulas.
Em Janeiro de 2009 foi condenado a dois anos de prisão (suspensos) e pode voltar a leccionar. O antigo código penal (até 2007) só previa a pena acessória de inibição para condenações superiores a três anos. O novo já permite, mas não obriga: fica ao critério do juiz. O ME podia aplicar-lhe a expulsão, mas o processo disciplinar foi arquivado por falta de provas.
Na quarta-feira, o Parlamento deverá aprovar a lei que permite acabar com a arbitrariedade. O diploma institui a apresentação obrigatória de registo criminal no recrutamento para empregos que impliquem contacto regular com crianças. A condenação por abuso sexual permanecerá no 'cadastro' vinte anos. A lei deverá entrar em vigor em Agosto.»
in Expresso online, 30-6-2009
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